Talento "cabrunco"
- Yan Tavares
- 5 de fev. de 2016
- 4 min de leitura
Atualizado: 6 de abr. de 2020

Acha o movimento cultural de Campos pouco valorizado? Acha que isso impede o nascimento de novos talentos na terra Goitacá? Muito se enganam os que pensam que da cidade saem apenas jogadores de futebol - o que é também é um grande orgulho para os campistas. Mas onde estariam outros talentos do município, se não no esporte? Quem sabe escondidos, tomados pela poeira do esquecimento que assola a cultura da Planície?
Eis que um dia, em uma despretensiosa conversa entre amigos, um deles, carregado de conhecimento, descreve com os olhos brilhando e carregados de orgulho a sua filha, que vive no Rio de Janeiro e atua em uma profissão literalmente fantástica. Meu amigo fala também do exemplo de caráter que a menina havia se tornado.

Ao me interessar pelo enredo, vindo de alguém de muita vivência, eis que surge a ideia que talvez pudesse render uma boa história para contar. Então, é hora de partir para a sugestão de pauta e, após obter a aprovação, seguir para a apuração. Por fim, são descobertos um talento e uma personalidade “cabruncos” - raiz que nossa personagem não esconde.
Campista, hoje residente no Rio de Janeiro e desde os nove anos estudando teatro – momento em que ingressou na Cia. Persona, em Campos -, Lívia Ataíde revela que sempre teve a arte como um sonho e a vislumbrou como ideal para a vida. “Penso o teatro como necessidade para tornar as pessoas melhores nesse mundo em que elas se encontram tão agressivas e vazias”, declarou a formanda em direção teatral pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Desde os 18 anos, quando foi aprovada na universidade, ela, que já atuava no teatro campista, decidiu partir para a capital visando trilhar seu futuro. Amor à arte

Hoje, atuando como atriz e diretora, ela também exerce outra função, que segundo a própria, foi uma paixão que descobriu a princípio por demanda financeira: iluminação artística. Mas ao ser indagada quanto ao que prefere fazer, Lívia é enfática:
“Prefiro não eleger uma função especial. Faço teatro e ponto. Posso exercer essas funções quando é preciso ou tenho vontade”.
Em outro momento da conversa, Lívia fala sobre quem se ilude e acaba não se encontrando com a profissão.
“Há pessoas que levam para o lado do glamour, e não é por aí. Quem vem para o teatro com esse intuito se decepciona, ao contrário dos que vêm para fazer o seu trabalho”. Hoje, aos 24 anos de idade e há 15 no teatro, ainda com aparência de menina, mas personalidade de gente grande, ela analisa a crise atual por qual a arte passa.
“O movimento cultural está muito difícil, mas o teatro desde sempre se refez nos momentos mais complicados”, destacou. Mais valor ao teatro campista Quando questionada sobre as possíveis iniciativas para que se cresça culturalmente e se possa dar o devido olhar ao teatro no país, e principalmente em Campos, Lívia ressalta:
“Penso que o que pode ser feito para melhorar o teatro em Campos ou em qualquer lugar é repensar as políticas de fomento e distribuição dos investimentos e espaços”. Ainda sobre Campos, ela pondera entre a real importância dada ao teatro em nossa terra. “O movimento teatral de Campos é muito importante, mas muito pouco valorizado. É preciso pontuar espaço, verba e política cultural como um todo, é tudo muito falho. Penso que este merecia maior atenção, um olhar mais carinhoso e eficiente. Foi no teatro campista que aprendi a ser alguém, onde ainda hoje há novos profissionais resistindo e surgindo. Há grandes pessoas fazendo teatro, não só na Persona, onde me criei, mas em todo o movimento, e isso merecia ser mais valorizado”, disse.

Quanto às inspirações artísticas, Livia vai de encontro ao que se espera de uma resposta “natural”. “São muitos os artistas nos quais me inspiro, mas a maioria deles são justamente os que estão próximos, pensando teatro de forma potente e fazendo com que toda esta situação se transforme em dispositivo para a criação. Quanto aos que estão um pouco mais longe, me inspiram os que têm claros os seus posicionamentos políticos e estão a todo o momento se reinventando em suas práticas”, firmou a campista de vários visuais, várias cores de cabelo e personalidade única.
Viver de teatro Com uma rotina corrida, ela relata que nas horas vagas não faz nada especial, ao contrário, faz a coisas simples, que por vezes se perdem com a falta do tempo. “Saio com amigos, bebo alguma coisa, converso, escrevo, ouço música, rolo a timeline do Facebook sem prestar muita atenção, enfim, nada muito especial ou diferente”.

Por fim, para quem sonha teatro e pensa em desistir de fazer, Lívia manda um recado.
“É bem mais difícil do que você imagina. Dá para viver bem, só não é fácil ser rico e famoso, caso você almeje isso. Mas você vai saber de coisas e ver o mundo de uma forma única. O teatro vale muito à pena”, afirma.