top of page

Enem: realidades sociais distintas interferem na preparação

  • Nickolas Abreu, Naiana Vianna, Rafael Abud
  • 13 de jun. de 2018
  • 5 min de leitura

Atualizado: 4 de abr. de 2020


Reprodução EBC

Quando os adolescentes encontram-se próximos de terminar o ensino médio, uma de suas principais preocupações é a realização do Exame Nacional de Ensino Médio (Enem) e, consequentemente, a escolha pelo curso de nível superior a seguir. Eles se veem pressionados pela escola, pelos familiares e por eles mesmos a tomarem a melhor decisão. O Enem seleciona, há 20 anos, alunos para universidades públicas, além de bolsas para a rede particular no país. Em 2018 o vestibular teve 5,5 milhões de inscritos.

Um sentimento que une cada participante é a ansiedade, considerada positiva até certo ponto, de acordo com a psicóloga clínica Maria Leia. “A ansiedade até um determinado grau nos move a tomar atitude e ter iniciativa, mas em excesso nos paralisa e nos impossibilita”, explicou a especialista.

Para lidar com essa situação, a estudante Camila Carvalho Leite, de 18 anos, usa técnicas de respiração para acalmar-se e pensar positivo. “A sociedade joga em cima do adolescente a cobrança de estar na faculdade muito cedo e a escola, junto com a família, também exige demais. Essa pressão pode ocasionar problemas mentais ao jovem como depressão e casos de automutilação. Cada ser humano é único e lida com a cobrança de maneira diferente. A família e a instituição de ensino devem ficar atentas e explorar as habilidades e o melhor de cada aluno”, diz a psicóloga Maria Leia.

Arquivo pessoal

A candidata ao Enem 2018, Camila, revela sofrer pressão dos familiares, mas não abertamente. “Minha mãe quer que eu faça uma faculdade diferente da que eu realmente quero fazer, e ela tenta me incentivar a me esforçar mais, mas as palavras dela de incentivo muitas vezes me atrapalham mais do que ajudam. A intenção é boa, mas o psicológico da gente fica complicado”, destaca Camila.

A estudante ainda relata o quanto é difícil ficar em casa na rotina de estudos enquanto seus amigos estão se divertindo. Para isso, ela busca se programar para ter uma vida social e não viver só em função das disciplinas. “É importante manter a saúde mental e física, tudo tem que estar em equilíbrio também é necessário para obter um bom resultado. Mas é muito difícil resistir e ficar em casa ao saber que seus amigos estão se divertindo. Mas entendo que sacrifícios são necessários. Eu quero fazer medicina, penso em ajudar as pessoas do jeito que os médicos ajudam, cuidam das famílias. A questão de dar segurança, passar confiança e ajudar as pessoas foi o que eu sempre quis, então vai valer a pena”, completa a estudante.

Com o objetivo de estabelecer uma rotina saudável e ter um bom resultado, o participante deve obter uma boa alimentação, período de sono e intervalos corretos entre as horas de estudo para conseguir desempenho satisfatório. O estudo em grupo também pode ser utilizado como uma técnica para aliviar o aluno. É uma maneira de compartilhar suas emoções, experiências e dificuldades. No entanto, a psicóloga Maria Leila destaca que estudar individualmente e aliar a prática de exercícios são fundamentais para o desenvolvimento do pré-universitário.

Cursos pré-vestibulares e isolados em alta após a implantação do Enem

O Enem proporcionou mudanças não só para os participantes, mas também no Sistema Educacional Brasileiro. As escolas tiveram que se adaptar à demanda dos alunos para participarem cada vez mais cedo dos vestibulares. Assim, materiais didáticos se tornaram cada vez mais exigentes ao conteúdo da prova e a própria estrutura escolar teve que passar por modificações. De salas pequenas, ambientes mais amplos. A grade curricular também sofreu alterações. No entanto, nem sempre os três anos exigidos para concluir o ensino médio tornam-se necessários para que os alunos cheguem à universidade.

Em busca de atender essas carências, surgiram os cursos pré-vestibulares e, recentemente, uma nova modalidade denominada de "isolados". Professor universitário, atuante há mais de 10 anos em escolas particulares e com passagem pela rede pública do estado do Rio de Janeiro, Guto Verçosa, atualmente também é proprietário de um curso. Para ele, o principal diferencial entre os pré-vestibulares e os isolados encontra-se no estímulo externo que o aluno adquire durante as aulas.

Reprodução Uol

"O pré-vestibular costuma ter 130 pessoas em uma sala. Acaba se tornando uma preparação mais ampla que o aluno tem sobre cada área de conhecimento. O isolado você acaba sendo pontual. Por esse lado, se torna mais fácil o aprendizado. Há um estímulo externo também. Você olha pro lado, e vê que todo mundo quer o mesmo objetivo. Além do professor oferecer uma dedicação mais exclusiva às dificuldades existentes", ressaltou Verçosa.

Guto comentou ainda a respeito da preparação dos participantes para o Enem e dos demais vestibulares. Segundo ele, mais do que querer fazer a prova, o aluno tem que estar decidido da escolha. "Costumo dizer que o determinante não é querer algo. É o quanto ele quer e a decisão pelo objetivo. Se você quer ser jogador de futebol, por exemplo, vai precisar se dedicar a uma melhor qualidade física e ter todo um esforço necessário até conseguir estar apto. O mesmo acontece quando se prepara para realizar provas de vestibulares, concursos ou qualquer processo seletivo. O quanto você quer é essencial", destacou o professor.

Sobre a ansiedade de querer fazer provas de ingresso à universidade para deixar o ensino médio antes dos três anos previstos para a formação, Guto não considera o ideal. No entanto, considera que há exceções. "O aluno no primeiro e segundo ano ainda está em processo de amadurecimento, não só psicológico, mas educacional. Acho que pode-se esperar mais um pouco. É importante a revisão dos conteúdos quando se faz o terceiro ano. Mas entendo quando o aluno realiza uma prova, acaba passando e chega à faculdade. Cada caso é um caso.", disse.

Carência estrutural prejudica o desempenho dos estudantes nas escolas públicas

No Brasil, as diferenças de poder adquisitivo também interferem na preparação para os processos seletivos. Não são todos que têm acesso a um ensino mais específico e, assim, precisam recorrer ao ensino oferecido nas escolas públicas. No entanto, a diferença de nível de preparação é assustadora, principalmente, pelas dificuldades estruturais das escolas que não oferecem o mínimo de suporte aos alunos.

Em um levantamento feito pela Secretaria de Estado de Educação, nas unidades de ensino do município de Campos dos Goytacazes e região, as unidades escolares estão em estado considerado ruim ou péssimo. De cada dez escolas, duas atendem aos padrões do Ministério da Educação. Segundo a secretária Julia Ribeiro, as principais precariedades são: telhado com risco de desabamento, goteiras dentro das salas, alimentação e material escolar cada vez mais escasso. “Quando está chovendo todas as salas começam a alagar. Fica tudo molhado e não tem faxineiro suficiente para limpar a escola. Os alunos é que pegam o rodo e limpam”, contou a secretária.

Com relação a reajustes para uma reforma de melhoramento no material e alimentação das instituições de ensino, Júlia Ribeiro informou não ter recursos financeiros suficientes neste momento para normalizar a situação dos aparatos e das refeições dos alunos. "Se nós juntarmos para resolver os problemas que temos nas escolas, conseguiremos conquistas incríveis”, finalizou.

Dessa maneira, percebe-se o nítido recorte social diferenciado no caminho dos estudantes até chegar às universidades. O que dificulta completamente o acesso dos participantes oriundos das escolas públicas, e fazem com que as cotas sejam cada vez mais necessárias como forma de mitigação social.

Reprodução R7


bottom of page